sexta-feira, 29 de maio de 2015

O SUS e o tratamento dado ao piloto do avião, Luciano Huck, Angélica e família

Paulo Ferreira

“Todos são iguais perante a lei” - Constituição Federal – Art. 5°.


T
eria sido mais um acidente sem maiores conseqüências: no dia 24 de maio, bimotor com oito passageiros faz pouso forçado  em campo agrícola – todos foram salvos. Mas tinha um diferencial: os passageiros não eram “pessoas comuns*”. As vítimas foram conduzidas para os atendimentos médicos de praxe. Disseram que não havia mais leitos. Até aí, tudo “normal”. Mas depois de saberem que se tratava dos apresentadores de televisão Luciano Huck e da esposa Angélica, “milagrosamente” foram atendidos em leitos que não estavam sendo oferecidos para pacientes do Sistema Único de Saúde – SUS.
          O Conselho Municipal de Saúde de Campo Grande quer saber de Wilson Telesco, presidente da Santa Casa, o motivo do casal global, prole e duas babás terem serem atendidos em leitos que não estavam sendo destinados aos pacientes do SUS. Em nota, a Santa Casa divulgou que “em momento algum negou ou recusou a qualquer pessoa que porventura tenha procurado o hospital ou encaminhada para assistência pelos entes reguladores...A Santa Casa reitera que pacientes que necessitam de atendimento na referência exclusiva do hospital (politrauma, neurocirurgia e queimados), bem como aqueles não dependentes de respiração artificial, continuam sendo acolhidos na mais absoluta normalidade...”
          Méritos aos anjos da guarda do piloto e da família do Huck que incensaram as almas e todo o ambiente hospitalar – e tornaram também todos os humanos mais humanos. O caso pelo menos já deixa suspeita, pois o que vemos nos resto do país é exatamente o oposto -  pacientes desse mesmo SUS nas macas, pelos corredores deitados no próprio chão a espera de um atendimento que muitas vezes quando chega, de forma precária, o doente já morreu. O socorro muitas vezes corresponde ao prestígio do doente. Ricos, famosos quando num “aborto da vida” precisam do SUS não sofrem as agruras por que passam as pessoas comuns. De certa forma, o dinheiro os vacina do “mal de ser pobre”. Uma minha amiga enfermeira me falou que quando entra uma vítima desacordada e, se por isso não poder ser identificada no momento do atendimento, olha-se a marca de cuecas e calcinhas – padrões mais caros – melhor o atendimento às vítimas. É a banalização da vida – roleta russa. É uma espécie de estrato social formado de castas – o atendimento vai depender de seu status.
          O Sistema Único de Saúde – SUS foi criado através da Lei n° 8.080, de 19 de setembro de 1990 que preconiza entre tantos princípios:


TÍTULO I
DAS DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 2º A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.

CAPÍTULO II
Dos Princípios e Diretrizes
Art. 7º As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que integram o Sistema Único de Saúde (SUS), são desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas no art. 198 da Constituição Federal, obedecendo ainda aos seguintes princípios:
I - universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência;
II - integralidade de assistência, entendida como conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema;
III - preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua integridade física e moral;
IV - igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie;
V - direito à informação, às pessoas assistidas, sobre sua saúde;
VI - divulgação de informações quanto ao potencial dos serviços de saúde e a sua utilização pelo usuário;
VII - utilização da epidemiologia para o estabelecimento de prioridades, a alocação de recursos e a orientação programática;
VIII - participação da comunidade;
IX - descentralização político-administrativa, com direção única em cada esfera de governo:
a) ênfase na descentralização dos serviços para os municípios;
b) regionalização e hierarquização da rede de serviços de saúde;
X - integração em nível executivo das ações de saúde, meio ambiente e saneamento básico;
XI - conjugação dos recursos financeiros, tecnológicos, materiais e humanos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios na prestação de serviços de assistência à saúde da população;
XII - capacidade de resolução dos serviços em todos os níveis de assistência; e
XIII - organização dos serviços públicos de modo a evitar duplicidade de meios para fins idênticos.

          O episódio ocorrido em Campo Grande – Mato grosso do Sul com piloto do avião, Luciano Huck, Angélica, três filhos e duas babás abre o tumor que é a saúde pública no Brasil – a cura é difícil – mas não impossível.
          “O SUS é o melhor plano de saúde do mundo. Que outro plano de saúde vai pegar o doente em casa?” – Dr. José Elias Aiex Neto - entusiasta e um dos gestores do SUS em Foz do Iguaçu – Paraná.


* Como se referiu Lula ao Sarney em junho de 2009.