sexta-feira, 27 de novembro de 2015



Semana de 27 de novembro a 4 de dezembro de 2015

Professor no lugar de alunos; alunos no lugar do professor

Paulo Ferreira

“O verdadeiro trabalho político numa sociedade como a nossa é criticar o funcionamento de instituições que parecem neutras e independentes: criticá-las de modo que... possam ser combatidas” – Michel Foucault.

I
nstituições de ensino fazem isso há certo tempo: quando se aproxima o final de cada semestre são distribuídos questionários para “classificar” professores. Se ele é bom, regular ou ruim. Essa operação também pode ser realizada via Internet.
          A natureza não dá saltos. O homem em sua condição natural tem a evolução em seu devir – também sem dar saltos. E apesar de dominarem o Planeta, os mamíferos representam a classe dos seres vivos que se desenvolve mais lentamente. Ao contrário dessa realidade darwinista, e parecendo que jogaram fermento  no cérebro da briosa classe estudantil, elevando-a a uma condição de uma casta social e biologicamente superior – juiz. Na vida prática nem todos tem os devidos méritos para tal. Muito preparo, muita leitura: Filosofia, Antropologia, Sociologia, Psicologia entre outras. E quando a sala de aula reduto ensinoaprendizagem se transforma num tribunal de exceção, o professor, antes “autoridade máxima na sala de aula” se vê reduzido à condição de réu. A que ponto se colocou o professor, a que ponto chegamos nós e toda sociedade. Um profissional que passou boa parte da vida estudando, se esforçando, participando de cursos, seminários, ter de ser submetido a tamanho tratamento, para não dizer, humilhação. Julgamento: caso na turma tenha pelo menos um aluno que não goste do professor e, deseje que o mesmo deixe a escola, aí o profissional vai sumariamente para a rua engrossando as estatísticas dos desempregados. Guardadas as devidas proporções, algumas escolas são grandes centros empresariais e, aluno recebe tratamento de cliente. Empresário não quer perder clientes. Acha mais fácil demitir – consequência de processo erosivo na argamassa social, principalmente no mundo pós Revolução Industrial. Todo esse procedimento seria normal e até socialmente aceitável se todas as demais profissões também passassem pela mesma peneira: políticos, juízes, engenheiros, médicos, psicólogos, administrativos, assistentes sociais, técnicos de nível médio – uma geral. Quando compramos uma passagem de avião, não sabemos qual modelo da aeronave, se sua condição de segurança está dentro da normalidade, se o piloto e co-piloto estão com saúde em dia, se tem alguém alcoolizado, qual o total de horas de experiência – todo um histórico cultural-comportamental que denote segurança e seriedade e respeito à vida de todos. Não vemos nada disso. Apenas nos informam o preço da passagem. Disso precisamos saber, nada mais.
          E assim, dessa maneira o tempo da famigerada palmatória tão criticada pelos estudiosos  desapareceu para todos . Menos para o professor que ainda apanha e muito.
          Mudaram muita coisa na Educação. Jogaram muita poesia onde também deveriam ser mostradas também tragédias. Trocaram a Escola Tradicional – tida como herança das Escolas Públicas Francesas do período iluminista, no século XVIII. Modelo que até então vinha dando certo: aluno respeitava professor. Nessa medida, se ainda vai piorar a condição geral de ensino não sabemos.
          O que sabemos é que Educação sucateada em todos os sentidos é pior que a queda de um avião – nesta os efeitos são de certa maneira imediatos e mensuráveis; naquela, os efeitos são invisíveis e de  difícil quantificação estatística.
          Aliás, nem com queda de avião também nos preocupamos.

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Semana de 20 a 27 de novembro de 2015

O papel ajudando a construir a linguagem

Paulo Ferreira da Rocha Filho

O papel foi inventado pelos chineses lá pelo Século VI a.C.  A linguagem, por sua vez, surgiu primeiro mas sua origem se perde nas noites dos tempos.
          É difícil negar, mas o papel teve uma significativa função de todo o aperfeiçoamento de todo tipo de linguagem. Não era nada fácil escrever em pedaços de ossos, superfícies rupestres e até em materiais inimagináveis. Com seu uso facilitado por sua capacidade de portabilidade, dobrabilidade e durabilidade, bastavam essas três propriedades para justificar a universalização de seu uso.
          Quando usamos os recursos do word na computação, sempre que queremos arquivar um documento o “salvamos ”. E foi com esse gesto de escrever ao longo do tempo usando papel que até sem percebermos, que a humanidade foi “salvando” nos pergaminhos, papiros (parentes do papel) e no papel propriamente dito, a linguagem ainda em todo seu processo de construção, formando o  arcabouço cultural do mundo.
          E dessa forma, geração a geração, o papel nos acompanha do berço ao túmulo. Para o bem ou para o mal, é nosso companheiro íntimo.
          Ganhou até uma poesia:

Folha de papel
 Paulo Ferreira da Rocha Filho
                                  I
Numa folha de papel se registra um nascimento
Uma mágoa, um fingimento
Numa folha de papel se manifesta uma negação
Uma dúvida, uma aprovação.
                                  II
Numa folha de papel se educa,
Escrevem-se coisas boas, normais, outras malucas
Numa folha de papel se declara amor,
Uma paixão, uma desilusão, uma dor.
                                III
Numa folha de papel se celebra um casamento
Uma separação, um afastamento
Numa folha de papel se encontra a sorte
O desgosto, a frustação, a morte
                              IV
Numa folha de papel pode estar a Bíblia de Deus ou de Satanás o Anais
O tudo
Ou nada mais.

sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Semana de 13 a 20 de novembro de 2015

Gemeisnchaft  und Gesellschaft*
Paulo Ferreira

“Pensamos demasiadamente e sentimos muito pouco. Necessitamos mais de humildade que de máquinas. Mais de vontade e ternura que de inteligência. Sem isso, a vida se tornará violenta e tudo se perderá” - Charles Chaplin,

H
á muita diferença entre as relações nas sociedades caçadoras-coletoras e as que vieram com o advento da Revolução Industrial. Nessa abordagem, o sociólogo Ferdinand Tönnies (1855-1936) manifesta sua inquietação com a formação e direcionamento das relações sociais. Gemeisnchaft – ele cunhou as sociedades tradicionais. Os laços sociais eram mantidos nas famílias, crenças, costumes, cultura e religião. Esses grupos sociais formados estruturalmente de formas coesas, mantinham as amizades de forma mais confiável, sem interesses em função de poder, visto que ele existia de forma mais amenizada. Gesellschaft - as sociedades industriais, ao contrário, romperam com os laços que as uniam outrora. As fábricas com suas chaminés “vomitando” progresso agora interferiam de forma significativa nos relacionamentos. Estes passaram a ser com distanciamento, indiferença e frivolidade. Transcorridos quase 200 anos desse período e, considerando que a cada dia, as amizades mais se volatilizam, é de preocupar até mesmo porque a causa principal da perpetuação de espécie do Homo sapiens foi a colaboração. Esse item é de certa maneira um atributo cada vez mais raro.  
          Tudo isso é reflexo de um mundo corporativo e de exclusão social. O ser foi substituído pelo ter. Até conceitos foram mudados. Felicidade significa propriedade, posse. As pessoas são “felizes” quando estão comprando alguma coisa. As escolas têm como metas a formação de um profissional voltado para o mercado de trabalho. Somente isso. Temos inteligência suficiente para fabricarmos aviões e, também a temos para fabricarmos mísseis que os derrubam. Se sobra inteligência para destruir, faltam sentimentos que legitimem  nossa condição humana.
         Na construção da sociedade da Pré-História até a fase Contemporânea, o instinto da sobrevivência com a colaboração foram os dois elementos preponderantes que nos fizeram sobreviver.  O primeiro – Instinto de Sobrevivência ainda o temos. O segundo - Colaboração, cada vez mais se definha e se volatiliza. Caso nossos laços da Gemeisnchaft  (Comunidades tradicionais) não reatem, o amanhã fica cada vez mais incerto. Paira sobra a humanidade uma nuvem sombria de ameaça à sobrevivência. Até porque o homem isolado não sobrevive.

*Gemeisnchaft  und Gesellschaf  - (Comunidades tradicionais e Sociedade industrial) escrito em 1887.

sexta-feira, 6 de novembro de 2015



Semana de 6 a 13 de novembro de 2015
Cinema está em crise?

Paulo Ferreira

“O cinema não tem fronteiras nem limites.  É um fluxo constante de sonhos ”– Orson Welles.

A
 inteligência no cinema está em crise? Cinema é acima de tudo inspiração-criação. Fellini dizia que o cinema equipara o homem a Deus – tal é o poder de sua inventividade. Quase tudo já foi feito para as telas, desde a um dos pioneiros  “Chegada do Trem a Estação de Ciotat” em 28 de dezembro de 1895,  passando por  “E o vento levou” - (1939), “Casablanca”- (1942),  Titanic – (1997) e tantos outros– muito já se fez. O cenário em todo mundo mostra sinais de fadiga. O Brasil já sonhou com sua Hollywood quando criou a Cinédia em 1930, a Atlântida em 1941 e a Vera Cruz em 1949. Nos anos1950, tivemos “O cangaceiro” (1953) de Lima Barreto – Primeiro filme brasileiro premiado no exterior. Formou-se logo depois uma leva de filmes parecidos, pois todos queriam explorar o filão. Esse efeito imitativo foi visto também em Ben-Hur (1959) do diretor William Willer. Nele, temos cenas de duelo em quadrigas, quando o herói palestino bíblico Ben-Hur finalmente derrota o romano Messala. Também daí em diante, os filmes posteriores ao gênero, e pegando carona no sucesso, quase que obrigatoriamente tiveram também de mostrar  bigas ou quadrigas puxadas por cavalos em pena ação. O cansaço viria retratado na própria tela, antecipado como próprio espelho, quando, na década de 1940,foi lançado “Crespúsculo dos Deuses” – (1950) no gênero noir. Nele, num argumento linear e previsível, os personagens são uma atriz que havia sido bastante iluminada pelos holofotes da fama e um roteirista desacreditado e com aparente perda do vigor criativo.  Podem surgir com isso imitações -  um passa a imitar o outro. É quando se tem uma tentativa recorrente e sem criação. Por sua vez, o cinema brasileiro quase sempre explora a miséria e violência urbanas não contextualizadas com suas origens socioeconômicas. Mostra nossa barbárie e, quando depois saímos da sessão, sentimos um mal-estar tipo esgotamento espiritual – pois o filme pouco ou nada acrescenta de positivo. É fácil explicar esse veio: produção com poucos atores e recursos que economizam com cenários porque estes já existem nas cidades brasileiras. Para completar, basta convidar um rosto conhecido principalmente das novelas para serem os mocinhos. Bandidos são os desconhecidos, mesmo que sejam extremamente talentosos. Quanto à produção, deixa-se sob os auspícios da “mamãe” Petrobras.
          A crise é de criação, não é econômica mesmo não se tratando de filmes do gênero “Monumentalista”.  Há inclusive trilogias, polilogias e outras quantificações que extrapolam qualquer raciocínio lógico que cai depois num grande esvaziamento.
          Margaret Mitchell, vencedora dos prêmios Pulitzer e National Book Award, autora de “E o vento levou”, foi convidada por um estúdio  para dar sequência  tipo “E o vento levou 2”. Ela peremptoriamente recusou tal proposta. Não que lhe tenha faltado criatividade – sobraram-lhe honestidade e respeito ao público cinéfilo.