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2) Violência: homem enjaulado e cristãos
decapitados
Paulo
Ferreira
“A injustiça num lugar qualquer é uma
ameaça à justiça em todos os lugares”
- Martin Luther King.
A
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televisão semana passada mostrou uma cena que
poderia ser de um zoológico, porque tinha uma jaula. Mas tinha um homem dentro
dela. Não é mais um Zoológico. O prisioneiro da Jordânia, não tinha como
escapar da robusta prisão. Foi anunciado que a vítima seria incendiada ainda
com vida. As imagens do fogo não foram mostradas na televisão brasileira. Somente em jornais impressos. Foi uma morte mostrada como um show pirotécnico. A pirotecnia foi
inventada na China para, por meio de fogos, entreter os imperadores. Hoje, o
fogo que ajudou a construir a civilização cozinhado os alimentos e fundindo
metais, é usado para destruir seres humanos. Os autores do vídeo fazem questão de gravar
as imagens “para a posteridade”. Fazem “justiça” à sua maneira. As imagens são distribuídas aos canais de televisão para servirem de exemplo. É a “Sociedade do
espetáculo”descrita, por Guy Debord em sua obra clássica. No dia seguinte
e os próximos também, a vida para todos se comportou seguindo sua trajetória
normal. A natureza no seu eterno devir e, cada um seguindo seus passos friamente
como se o fato não tivesse acontecido. Mas aconteceu, aconteceu com o outro.
Não foi comigo nem com ninguém de minha família. Esta é a linha de raciocínio
de muitos – é um torpor geral. Também estão decapitando os cristãos. Voltamos à
barbárie. Só que com uma diferença. Naquele tempo os humanos matavam os grupos
hostis. Tinha competição e os mais fortes dominavam os mais fracos. O destino
destes estava nas mãos daqueles que detinham o poder. Os antigos eram
insensíveis porque tinham de sair para caçar, passar horas a fio longe da
convivência familiar, arriscando a vida, esperando a presa para trazer proteína
para si e para o grupo. Precisavam se apossar de pertences e de terras. Essa
insensibilidade era uma espécie de couraça na pele para proteção das
intempéries e, até enfrentar no braço e com armas rudimentares, animais
ferozes. Os 86 bilhões de neurônios trabalhavam apenas para a sobrevivência.
Hoje que não existe competição por
alimentos. A vida de um não depende mais da morte do outro. Estamos repetindo a
violência como se o tempo passasse sem nenhuma reflexão e transformação.
Tivemos pacifistas como Ghandi, Martim Luther King, D. Hélder Câmara e o maior
deles – Jesus Cristo. Para os violentos, essa lição ainda não foi aprendida.
Era de se esperar que diante desses
fatos, o mundo inteiro parasse e, se posicionasse contra esse tipo de
violência. Até parece que de tanto convivermos com ela, internalizamo-la e, daí,
também nos tornamos insensíveis. Atualmente se faz passeatas e outros tipos de
manifestações para quase tudo: aumento do custo de vida, geração de emprego, até
impeachment de
presidente da república. Como um de nós se sentiria por trás daquelas grades,
sabendo da iminência da morte?
Leitor
atento imagine alguém lhe encharcando de gasolina para depois lhe atear fogo.
Ou então lhe cortando o pescoço como fazem com os critãos.
Com cada um somente pensando em si, desta
vez enclausurado mas nos seus aposentos, este fato de forma indireta alimenta
mais ainda a violência.
Vivemos
num mundo que a proteção física é apenas para quem tem posses e para próprio
capital. Perceberam o aparato de carros-fortes e da guarda treinada para esse
fim? Pela leitura de mundo, dinheiro é número. Ser humano que deveria ser nome
é somente número. Mas diferente da conotação de dinheiro. Dinheiro era para ser
somente dinheiro. Capital era para sermos todos nós, até por uma questão
etimológica que a palavra é de origem latina – caput, capitis – essencial,
primordial o cabeça, o centro, o que governa.
O Brasil poderia dar um bom exemplo.
Um país que tem Ibama e outros institutos de preservação da vida, com leis
ambientais que protegem flora e fauna, não mexeu sequer um músculo para
defender esses humanos. Se árvores, pássaros, cobras e lagartos estão sob a
égide da justiça, por que não nos insurgimos contra a matança humana? E o resto do mundo, por que também não fez
nada? Quando cruzamos os braços, é como
se permitíssemos essas atrocidades.
“O que me preocupa não é o grito dos
maus. É o silêncio dos bons” – Martin Luther King.